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Hibisco


por Miguel Boieiro




      As infusões e as decocções de plantas vulgarmente designadas por chás, embora não o sendo, uma vez que os verdadeiros chás são os que provêm da Camellia sinensis e não de outras espécies vegetais, tornou-se uma moda corrente. Ainda bem, já que podem substituir vantajosamente bebidas alcoólicas, gaseificadas ou açucaradas que pomposamente são intituladas como digestivas. Há, grosso modo, dois tipos de “chás”: os que funcionam como mezinhas e são pouco agradáveis ao paladar, como o do fel-da-terra ou o de alcachofra, os quais bebemos com sacrifício, e os que são prazenteiros, embora, às vezes, com escassos efeitos medicinais. Num caso e noutro, para além do bom estado de conservação das plantas utilizadas, há que ter sempre em conta a qualidade da água em que são submergidas.

      Sem dúvida que a invenção das saquetas contendo extratos de plantas secas tem facilitado a comercialização e a difusão dos “chás” e simultaneamente vêm dilatando os lucros dos negociantes que, segundo nos alertaram, chegam até a acrescentar corantes e aromatizantes artificiais para aliciar incautos compradores. Não nos podemos esquecer que, nesta sociedade capitalista neoliberal em que nos é dado viver, o lucro constitui sempre o fator dominante, determinando as alterações de comportamento dos cidadãos consumidores.

      Esta conversa introdutória vem a propósito da recomendação de uma querida amiga para escrever sobre o hibisco, planta que proporciona uma deliciosa infusão com uma agradável coloração carmesim muito agradável à vista, porque “os olhos também bebem”.

      Ora os hibiscos, plantas da nobre família das Malvaceae, são arbustos que se encontram cultivados em muitos jardins públicos e privados como plantas ornamentais (temos um no quintal que, quando está no cio com exuberante floração, suja-nos a roupa com o seu pólen alaranjado). Segundo julgamos saber, trata-se do Hibiscus rosa-sinensis, mas não é esse o que agora queremos.

      A crer no magnífico Guia da Flora de Portugal Continental, de André Carapeto, Paulo Pereira e Miguel Porto, editado em 2021, pela Imprensa Nacional, temos cá, espontaneamente, em estado silvestre, apenas o Hibiscus palustris. É, entre nós, uma espécie muito rara e em perigo de extinção que surte em solos húmidos, na orla das madres de água, algures na Beira Litoral. Tal asserção é também confirmada no “site” Flora-on. Mas, também não é esse o que pretendemos para fazer o nosso “chá”.

      Das centenas de espécies de hibiscos que existem no mundo, com destaque para o syracus, o abelmoschus, o elatus e o esculentis (quiabo), o que verdadeiramente nos interessa para elaborar a afamada tisana, é o Hibiscus sabdariffa, planta predominante nas regiões de climas quentes.

      Todos os hibiscos possuem folhas simples, alternas, ovais ou lanceoladas com margens levemente dentadas. As flores dispõem-se em forma de trombeta e são normalmente de cor vermelha, embora, por virtude de hibridações e cruzamentos há, nos hibiscos ornamentais, flores amarelas, brancas, lilases, rosas, etc. Os cálices florais têm cinco sépalas e o mesmo número de pétalas providas de longo pistilo carregado de profuso pólen.

      Para confecionar o “chá” de Hibiscus sabdariffa utilizam-se não só as pétalas, mas os próprios cálices florais. A infusão fica com uma coloração vermelha bastante atraente e um agradável sabor agridoce.

      Diz-se que o referido hibisco contém antocianinas, as quais proporcionam a característica cor avermelhada, mucilagens, ácidos cítrico, málico e tartárico, provitamina A, vitamina C e do complexo B (B1, B2 e B3), cálcio, cobre, ferro, fósforo e magnésio.

      Investigações efetuadas apontam para propriedades medicinais relevantes: redução da hipertensão (três chávenas diárias), curas de emagrecimento, controlo do colesterol e regulação da função hepática. Refere-se ainda que a planta é antioxidante, anti-inflamatória, calmante, adstringente, diurética e levemente laxante.

      O “chá” é muito apreciado em Itália e na maior parte dos países africanos. No Senegal, Malásia e Havai, a própria flor é considerada emblema nacional. Nos países caribenhos é famosa a chamada “Água de Jamaica” que agrega gengibre e um pouco de rum, para tomar fria ou quente. Devido à existência de mucilagens, é também possível elaborar apreciáveis geleias.

      Os entendidos acrescentam que uma boa parte dos hibiscos ornamentais que se veem nos nossos jardins podem ter índices elevados de toxinas e que, por isso, as suas flores não devem ser utilizadas para fazer “chás”. No entanto, há quem refira que também possuem propriedades curativas, nomeadamente que acalmam a tosse e as anginas. Na dúvida, é melhor não experimentar e cingirmo-nos só às flores da espécie sabdariffa, com, ou sem gengibre e umas gotinhas de rum.

      MIGUEL BOIEIRO

      21-03-2022

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